Estranhos momentos os que estamos vivendo no Brasil. Há poucos
dias os jornais publicaram a foto de um encontro no Palácio da Alvorada.
De mãos dadas, a presidente e seu mentor posam vitoriosos, enquanto
o presidente do PT e dois alegados chefes publicitários da
futura campanha ré eleitoral, embevecidos e sorridentes, antegozam
futuros êxitos. Por que tanta alegria?
Alienação
"Estando no
poder central, eles não se dão conta do que vai pelas ruas, nem do que acontece
no mundo? Não estariam a repetir a velha história de Maria Antonieta na
Revolução Francesa?".
Será que, estando no poder central, eles não se dão conta do que
vai pelas ruas, nem do que acontece no mundo? Não estariam a repetir a
velha história de Maria Antonieta na Revolução Francesa? Não que eu
esteja também a delirar. Bem sei que não há qualquer revolução à vista.
Mas a esdrúxula foto faz recordar o ânimo fútil da rainha, com os
maiorais se deixando flagrar tão despreocupados, enquanto as pessoas
estão, na realidade, assustadas. Assustadas com as sombrias perspectivas do
futuro, temerosas da violência larvar de um povo que era tido como pacífico
(não há dia sem ônibus queimados, nem sem pessoas amarradas apanhando dos
que descreem da Justiça e querem fazê-la por conta própria), espantadas com a
montanha de lixo jogada nas ruas pelos cariocas em um só dia de greve dos garis
no Carnaval.
Crise energética
"Medidas do
governo quebraram o caixa da Eletrobrás, destruíram as possibilidades do
etanol, deixaram as hélices das eólicas paradas e reduziram quase à metade o
valor das ações da Petrobras".
Só com muita imprevidência foi possível fazer-nos mergulhar na
crise energética a que estamos embrulhados. As medidas governamentais
quebraram, ao mesmo tempo, o caixa da Eletrobrás, destruíram as
possibilidades do etanol, deixaram as hélices das eólicas paradas à espera
de linhas transmissoras e, ainda por cima, reduziram quase à metade o
valor das ações da Petrobras. Será que o petróleo era nosso e o pré-sal,
por pura teimosia propagandista e incompetência, é deles?
Quanto desgoverno. E a perda continuada do poder de compra dos
assalariados, que a inflação de 6% ao ano (na verdade bem mais) dilui, os
truques de contabilidade criativa que não enganam ninguém e a inépcia
administrativa que transforma em mera propaganda os projetos bombásticos?
O que dizer da receita garantida para o clientelismo e a inépcia
assegurada por 30 partidos no Congresso e 39 ministérios?
Seria injusto, porém, atribuir esses males a uma só administração.
Percebe-se um suceder de acontecimentos negativos levando-nos,
neste estranho e preocupante momento, à beira de perder uma
oportunidade histórica, a de consolidar uma democracia de verdade e
permitir nos livrar da síndrome do baixo crescimento, que limita o
bem-estar e impede o acesso ao primeiro mundo.
A situação é tão grave que é chegada a hora para o conjunto da
"classe politica" assumir parcelas de responsabilidade sobre os
rumos do Brasil. Por isso é tão chocante aquela foto de regozijo.
Os líderes governistas, em vez de exporem à nação com realismo as
mazelas existentes e de apelar, quem sabe, a todos os brasileiros para se
unirem nas questões fundamentais, só pensam em dividir a sociedade entre
"nós" e "eles" para, apostando nesse pobre maniqueísmo
político, vencer eleições e se manter no poder.
Renovação
"É hora para
uma mudança da guarda, na esperança de que novos lideres tenham visão de
estadistas, e não a de meros chefes de clã".
É hora, entretanto, para uma mudança da guarda, na esperança de que
novos líderes, colados na escuta das ruas, tenham visão de estadistas, e
não a de meros chefes de clã. É hora de renovação, da força dos jovens aliada à
visão de grandeza construir a política do amanhã.
FERNANDO HENRIQUE CARDOSO - 82 anos, sociólogo, professor e pesquisador.
Foi senador, ministro das Relações Exteriores e da Fazenda, e presidente da
República (1995-2002)
Editado por: Edison Franco.
Nenhum comentário:
Postar um comentário